O que é ser um jovem protagonista? Para esses três jovens, de histórias e contextos diferentes, ser protagonista envolve mais que conquistar um bom emprego ou posição: envolve fazer algo diferente pelas suas vidas e pelas de outros. De acordo com a pesquisa O Perfil do Jovem Brasileiro, divulgada pela Faculdade de Comunicação Social da PUCRS em 2016, 85,82% dos jovens acreditam que seus pares “falam mais do que fazem”, usando o engajamento como forma de autopromoção – e, ao mesmo tempo, 81,94% veem como positivo qualquer tipo de engajamento.
Como esse engajamento pode surtir efeitos positivos para a sociedade?
MUDANDO VIDAS ATRAVÉS DO CONVÍVIO
Como você vê uma pessoa em situação de rua? Como alguém que precisa de comida e vestimentas ou como uma pessoa, com suas dores, desejos e vontades, com quem é possível conviver para reconstruir humanidade e cidadania?
Essas são as perguntas que motivaram Mallu Adoryan, 23 anos, estudante de psicologia da Unisc, a construir o Coletivo RUAS: Resistências Urbanas e Aprendizados Subversivos, na cidade de Santa Cruz do Sul. Mallu participou da DUX Conference, no mês de novembro, evento promovido pela Fundação Gerações, e explicou um pouco do seu projeto, também adicionado ao Mapa de Boas Práticas da Fundação Maurício Sirotsky Sobrinho.
– É até difícil para o entendimento, para as pessoas que participam, da palavra convivência. Ela abrange muita coisa, e foi ali que encontrei uma resposta mais próxima para o que pensamos. Não é só passar pelas pessoas que estão na rua, trocar meia dúzia de palavras, dar de comer, de vestir e ir embora. É ouvir, conversar, falar com elas, se aproximar dessa realidade – afirma a estudante.
O trabalho de entrar em contato com uma realidade diversa exige não apenas tempo, mas também cuidado. De acordo com a estudante, são comuns os casos de pessoas que se aproximam do Coletivo para ações institucionais – como, por exemplo, trotes solidários – mas mantêm uma “distância segura” de pessoas que vivem em situação de rua, como se não fosse problema de todos.
– Teve um caso que aconteceu, há pouco tempo, de uma estudante de medicina da UNISC, muito interessada, que estava fazendo comida para todos. Ela chegou às 8h da manhã. Só percebi que ela não estava preparada porque, ao meio dia, ela estava aos prantos, se justificando por não conseguir ficar mais tempo. Durante a noite, ela me ligou: “bah, Malu, estava falando com o fulano de tal, ele contou a história da vida dele”…e ela se comoveu tanto com aquelas histórias que não conseguiu. No futuro, provavelmente, ela estará preparada. Precisamos deixar esse convite aberto e ficar de corpo e coração – afirma Malu.
E o que um jovem precisa ter para ser protagonista de uma mudança social? Para a estudante, ver o protagonismo como uma conquista coletiva é o mais importante.
– O Coletivo Ruas acabou sendo uma consequência de uma soma de sentimentos que me movimentou, dentro do meu trabalho. Eu não consigo me dividir em vários pedaços, na vida profissional, pessoal, social – é uma forma muito completa, a soma de uma coisa. Eu me coloco em uma realidade que não tem nada a ver comigo, mas quero levantar uma bandeira de ação social para pessoas em situação de rua. O protagonismo está nas mãos de quem investe tempo, sentimento, em prol de alguma coisa, não em prol de algo narcisista e egocêntrico. Protagonismo é algo que contempla mais de uma pessoa em prol de uma causa.
O EMPODERAMENTO ATRAVÉS DE BONECAS NEGRAS
A comunidade quilombola da Coxilha Negra é uma das seis que estão na região de São Lourenço do Sul. Reconhecidas através da Constituição de 1988, as comunidades quilombolas foram estabelecidas ao longo dos anos como focos de resistência do povo negro, muitas vezes isolado das áreas centrais através de políticas de gentrificação urbana.
A estudante Geiza Ferreira, de 16 anos, desenvolve no quilombo o projeto Mulheres Quilombolas. Ele surgiu através de um trabalho da sua tia, Adriana, que tinha o sonho de comercializar bonecas negras. A iniciativa contou com o apoio do campus da FURG em São Lourenço do Sul e do Fundo de Amparo à Pesquisa do Rio Grande do Sul (FAPERGS), através de edital.
– O projeto foi uma forma dos quilombos serem reconhecidos. Aqui em São Lourenço, muitas pessoas não sabem o que é um quilombo. Além disso, é uma forma de quebrar o preconceito de crianças e adultos – afirma a estudante da escola Professor Rodolfo Bersch.
O projeto fortalece a idade dos povos do campo, pesquisando as temáticas dos povos tradicionais e as memórias dos quilombos através das narrativas de vida, das rodas de conversas e de oficinas de confecção de bonecas negras, envolvendo estudantes e toda a comunidade local.
– Aos poucos, percebemos que o preconceito com as bonecas negras diminuiu, e as vendas foram crescendo, mesmo sem ter um lugar fixo ou lojas que revendem os bonecos. Vendemos em festas, bancas e outros espaços que ganhamos para expor nosso trabalho – afirma Geisa.
O projeto, apresentado também na Dux Conference e colocado no Mapa de Boas Práticas da Fundação Maurício Sirotsky Sobrinho, promove o empreendedorismo entre a comunidade através do empoderamento e do reconhecimento histórico. Porém, na opinião de Geisa, o que precisaria acontecer para que mais jovens fossem protagonistas de histórias como essa?
– Talvez um movimento de mulheres negras. Precisamos sair às ruas e falar sobre os problemas que passamos – afirma a estudante.
ENGAJAMENTO PARA CONSTRUIR O BEM COMUM
O estudante Davi Neves, 18 anos, formado no projeto Go Code da Fundação Maurício Sirotsky Sobrinho, observou que existe uma enorme dificuldade do jovem perceber-se representado em espaços de política.
– Eu penso assim: se tem muito do mesmo, todo mundo consegue resolver. Se existe algo diferente, que precisa ser modificado por alguém, essa pessoa que promover essa mudança vai ser conhecida – porque fez uma inovação, algo diferente. Isso, para mim, é proatividade, dar a cara a tapa para resolver um problema – afirma Davi, que observa a necessidade de ser proativo como a principal para o jovem ser protagonista no seu meio.
O estudante da Escola Florinda Tubino Sampaio participa da vida política das instituições de ensino pelas quais passou – e observou que gestores escolares são muitas vezes impermeáveis às demandas dos jovens. Por isso, fazer pressão é essencial.
– Recentemente, assumiu uma nova direção (da escola) que queria ser neutra, mas manteve uma bagunça estrutural. Para conseguir qualquer coisa com eles era um parto. Eu comecei a fazer parte do conselho escolar só para a nova direção me ouvir. Eu criei, dentro do conselho escolar, uma ponte entre os estudantes e a direção. Só que não bastou apenas conversar com a galera e pedir para que eles viessem falar comigo, mas também ver os problemas da escola – declara Davi, que criou uma página da escola no Facebook para informar os estudantes das mudanças de horários com a greve.
– Eu sou um aluno muito assíduo, eu vejo os problemas que os alunos passam com a estrutura, a administração. Chegou um ponto que era tanto problema com modificação de horários que eu disse: “olha só, a gente precisa de um meio rápido para comunicar os estudantes das mudanças de horário, um caminho fácil”. Não só a gente chegar aqui e ver que mudaram os horários de todas as turmas, e ninguém tinha o caderno certo. Com isso, a gente conseguiu criar uma página no Facebook da nossa escola, onde são divulgados os horários, por exemplo. O aluno, antes de ir para a aula, já sabe das modificações de horário.
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