O Rio Grande do Sul tem cerca de 1,9 milhão de alunos em escolas públicas e privadas, com mais de 120 mil professores e centenas de milhares de outros trabalhadores em educação. Boas práticas nessas escolas impactam toda a população do Estado, embora nem sempre elas estejam visíveis e disponíveis para entendimento de todas as pessoas.
É com essa iniciativa que a Fundação Maurício Sirotsky Sobrinho lança o Mapa de Boas Práticas em Educação, no qual educadores das mais diversas áreas podem contribuir para multiplicar bons exemplos e ideias interessantes. Dos 98 projetos enviados, essas três histórias contam como a educação, em todos os níveis, impacta vidas e pode mudar a sociedade.
Arborização Urbana, Cidadania e Sustentabilidade
A cidade de Bagé, conhecida pelos seus longos e recorrentes períodos de estiagem, sofria no final dos anos 2000 com a falta de cuidado com as suas árvores. Além da disseminação de parasitas, as árvores eram cortadas sem nenhum cuidado, e ficavam longos períodos sem tratamento. Espécies estranhas eram plantadas em solos inadequados, e havia uma completa ausência de planejamento sobre quais seriam as ações necessárias para resolver esse problema.
A preocupação da sociedade de Bagé com o descaso em relação às árvores levou o município a reativar a Comissão de Arborização Urbana, que passou a contar com profissionais de universidades, do Instituto Federal local, de ONGs, associações e do governo municipal. A bióloga e secretária executiva Ketleen Grala, de 47 anos, que trabalha na pró-reitoria de extensão e cultura da Unipampa, fazia parte desse grupo.
– Essas pessoas começaram, em 2014, a fazer um levantamento das espécies e das condições sanitárias da arborização da cidade. Não buscamos, entretanto, a amostragem: fizemos um inventário árvore por árvore, em todo o município.
Para realizar esse trabalho, a parceria com as escolas de Bagé foi fundamental. Ao longo do inventário, os ambientalistas bageenses perceberam a enorme demanda que havia por uma educação ambiental correta, que trabalhasse conhecimento e conscientização sobre o plantio e o cuidado.
– Não é só plantar árvores e explicar a sua importância. Trabalhamos com sensibilização de crianças e adolescentes para o tema, técnicas de reprodução de mudas para usar em casa, como podar e tratar, pois o cuidado ajuda a resolver os problemas da arborização.
– A escola é um foco não só de aprendizado, mas também de dispersão dessas informações.
O inventário das árvores da cidade foi concluído em 2016, identificando milhares de exemplares de variadas espécies. As plantas receberam um QR Code, no qual qualquer pessoa, através da câmera do celular, pode obter informações sobre a espécie plantada e a melhor forma de cuidar dela. A partir desse ano, o projeto Arborização Urbana: Cidadania e Sustentabilidade passou a intensificar as atividades de conscientização ambiental nas escolas locais, através de seminários, oficinas, jogos e trabalhos de campo.
– É um trabalho de amor à cidade, de pessoas comprometidas com a melhora da qualidade de vida. Se cada pessoa doar um pouco do seu tempo, o ambiente será melhor para todos. E é uma boa prática porque é impulsionada por pessoas comprometidas com o tema, a cidade e o lugar onde vivem, e que querem multiplicar essas práticas para outros locais – declara Ketleen.
O Que É
Arborização Urbana – Cidadania e Sustentabilidade
Idealizadores
João Rockett, Tati Cavaçana, Norton Victor Sampaio, Tânira Maria Gimenez Sampaio, Ketleen Grala e Vanessa Rosseto.
Onde Aconteceu
Bagé (um projeto semelhante está começando em Dom Pedrito)
Quando Começou
Em 2014.
Áreas de Atuação
Educação infantil, Ensino Fundamental e Ensino Superior
Disciplinas Trabalhadas
Biologia, Habilidades Socioemocionais, Alfabetização, Artes Plásticas, Português.
Mais Informações
No Facebook e na página oficial.
Educação e trabalho para ex-dependentes químicos
Uma nova chance. Isso é o que a professora Silvana Raquel Gonçalves sonhou ao criar o projeto Acredita em Mim, implementado há quatro meses também em Bagé. Por meio de aulas realizadas à noite em um abrigo para ex-dependentes químicos em situação de vulnerabilidade social, ela deu o primeiro passo de uma transformação social que pretende reconstruir vidas.
– Dou aulas, mas também exerço aqui os papéis de mãe, tia, psicóloga e assistente social. Essas pessoas perderam tudo, família, casa, trabalho, dinheiro… Eles estão completamente abandonados – diz a professora de 44 anos que também é diretora durante o dia na Escola Municipal de Ensino Fundamental Marechal José de Abreu.
Em Bagé, a Unidade de Acolhimento Adulto (UAA), serviço do governo federal da Rede de Atenção Psicossocial, oferece acolhimento transitório exclusivamente às pessoas do sexo masculino com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas. Ali, homens que estejam em abstinência e em tratamento contínuo no Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (Caps AD), serviço do Sistema Único de Saúde, são acolhidos por até seis meses. O local tem espaço para dez residentes, mas no momento é ocupado por cinco, com 19, 26, 29, 31 e 65 anos. E é ali também que eles estão tento a oportunidade de construir um novo futuro liderado por Silvana.
– Faz quatro anos que eu frequento o local à noite para dar aulas, mas sempre sentia a necessidade de formalizar esse conhecimento transmitido para que de fato isso possa ser útil quando eles saírem daqui. Nós colocamos as pessoas numa redoma e não as preparamos para o resto – diz Silvana, que estudou Magistério, especializou-se em Gestão Escolar e é Mestre em Políticas Públicas em Educação pela Unipampa, em Jaguarão.
Foi a partir dessa inquietação que ela buscou apoio na Prefeitura e em uma escola da rede pública municipal para criar o Acredita em Mim. Na instituição escolar, ela agora recolhe os livros pedagógicos referentes ao nível de cada um dos residentes e leva para o UAA. Em outubro, eles farão os exames na sede da escola: três têm o Ensino Fundamental completo, enquanto os outros dois estudam para chegar lá.
– Tenho uma relação muito franca. Eu digo que eles são os culpados por estarem aqui, mas também digo que quem escreve a história somos nós, e que eles podem mudar se quiserem.
Além das aulas, o grupo tem atuado em uma cooperativa com serviços de olaria em que fabricam tijolos voluntariamente, diminuindo a ociosidade, um dos principais inimigos do tratamento. O próximo passo de Silvana é buscar parceiros para reinseri-los profissionalmente.
O projeto também ajuda no resgate da auto estima e da motivação pessoal, contribuindo para que os residentes tenham condições de disputar vagas no mercado de trabalho, podendo melhorar a condição de vida e resgatar a dignidade. Silvana confia no seu projeto como o primeiro passo de transformações pessoais. Por isso, também sonha que restabeleçam os laços rompidos com as famílias e enfrentem o preconceito aos olhos da sociedade.
– Eu quero vê-los no futuro saudáveis, inteiros e caminhando na rua com cabeça erguida. Se fracassarem, será meu o fracasso também. Mas agora querem vencer, buscam uma ressignificação pois já experimentaram a droga, sabem o que ela causa e no que transforma. Construí um outro olhar sobre a situação deles e quero que outras pessoas também possam mudar os seus ao vê-los.
O Que É
Acredita em Mim
Idealizadora
Silvana Raquel Gonçalves.
Onde é praticado
Em Bagé, na Unidade de Acolhimento Adulto (UAA).
Quando começou
Em abril de 2017.
Área de Atuação
Ensino Fundamental.
Disciplinas trabalhadas
Português, Matemática, Geografia, História, Artes e Habilidades Socioemocionais
Soletrando com as Mãos
Desde o ano de 2012, as escolas públicas estão autorizadas a oferecer a alunos com deficiência auditiva o ensino bilíngue, somando a língua de sinais brasileira (Libras) e o português escrito. Em Canoas, desde 2014, a Escola Municipal de Ensino Fundamental Vitória, no bairro Mathias Velho, oferece essa modalidade de ensino para pessoas com essa deficiência – no Rio Grande do Sul, a primeira escola pública bilíngue para surdos foi a Salomão Watnick, de Porto Alegre.
Para adaptar-se a esta realidade, as escolas precisaram mudar os seus projetos pedagógicos e as suas práticas de ensino. Foi assim que surgiu o projeto “Soletrando com as Mãos”, idealizado pela professora de geografia Carmen Pereira. A professora idealizou um jogo que é realizado em três etapas, durante o ano. Cada turma recebe uma palavra, e escolhe um representante que irá soletrar esta palavra. Essa palavra é soletrada com as mãos para um grupo de jurados, em até dois minutos.
– Eu lembrei dos jogos de soletrar da minha infância, que eram apresentados pelo J. Silvestre, muitos anos antes do Soletrando da Globo – afirma a professora de Geografia Carmen Pereira, 55 anos.
– Era uma brincadeira que motivava muito as crianças. Resolvemos adaptar isso à realidade da nossa escola. No primeiro ano foi um sucesso, os alunos menores quiseram muito participar, deram “um banho” nos maiores.
O Soletrando com as Mãos acontece há três anos na escola, e o projeto dura todo o ano letivo. No início do ano, são definidas as datas para as competições, e que normalmente acontecem nas semanas de retomada de aprendizagem (a antiga recuperação) dos trimestres. Os professores de todas as disciplinas levam os conceitos que serão aplicados e soletrados pelos alunos em língua de sinais, por datilologia.
A competição é sempre realizada com pelo menos um jurado surdo, para tirar as dúvidas dos professores ouvintes, além de estagiários com deficiência auditiva e professores de Libras. Cada turma escolhe um representante, a palavra é sorteada e os competidores têm até dois minutos para soletrar – se não conseguir, a palavra volta para o sorteio. Embora a competição tenha vencedores, todos os alunos que participam ganham medalhas.
– Esse projeto movimenta todo o grupo de professores e alunos das mais variadas idades. Essa interação é o mais importante. Na língua de sinais, as regras gramaticais são espaciais, diferente do português formal. Para eles, a língua é visual, o que dificulta a apreensão do significado da língua portuguesa escrita – afirma Carmen, observando que o projeto pode facilitar a inclusão também em outras escolas. – É simples de realizar, não dá despesas em excesso e valoriza o cotidiano do aluno, e motiva pela superação – conclui.
O Que É
Soletrando com as Mãos.
Idealizadora
Carmen Cristina Pereira.
Onde é praticada
Em Canoas, na Escola Municipal de Ensino Fundamental Bilíngue Vitória
Quando começou
Em 2014.
Áreas de Atuação
Ensino Fundamental e EJA.
Disciplinas trabalhadas
Todas as disciplinas da escola.
Confira outros exemplos
Conheço o mapa de boas práticas e acho muito importante que ela exista para poder dar oportunidades para as pessoas mostrarem que fazem de bom e também serem inventivas a continuar e conhecer como fazer melhorias em seus projetos.