Desde pequenos ouvimos o termo “bilíngue”, e normalmente relacionamos a expressão à pessoas que falam dois idiomas, bem como ao ensino de inglês, ou de qualquer outra língua estrangeira, como o espanhol, francês ou alemão. Entretanto, não é exatamente neste tipo de ensino bilíngue que a professora de geografia, Carmen Pereira, se especializou. Carmen e sua iniciativa integram o Mapa de Boas Práticas da Fundação Maurício Sirotsky Sobrinho!
Docente da E.M.E.F Bilíngue Para Surdos Vitória, a educadora, que já fez diversos cursos em Educação Inclusiva, criou um jogo para sala de aula em 2015, chamado Soletrando Com As Mãos. O que era um projeto pequeno, que buscava mudar a rotina dos alunos, se tornou exemplo de inclusão e cidadania.
A ideia, conforme relatado pela professora, era a criação de um jogo em que fizesse os alunos interagirem entre si, fazendo uso da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) e do português escrito. Carmen contou em entrevista para FMSS e GaúchaZH, que a inspiração para a iniciativa veio da sua infância, dos programas apresentados por João Silvestre – naqueles quadros de soletrar, primeiros na televisão.
O Soletrando Com As Mãos acontece durante todos os meses do ano escolar. Já no início do ano letivo, as datas das competições são definidas, e os professores de todas os campos de estudo escolhem as palavras e expressões que serão aplicadas e soletrados pelos estudantes em língua de sinais.
Para o bom andamento, a disputa conta sempre com pelo menos um jurado surdo, para que esse possa tirar as dúvidas dos professores e alunos ouvintes. Junto disto, ainda há estagiários com deficiência auditiva e professores de Libras que colaboram com a atividade como um todo. Cada turma, se torna uma equipe durante a brincadeira, e são os alunos que escolhem o seu representante no jogo.
Sendo assim, após a escolha, a palavra a ser soletrada em língua de sinais é sorteada e os competidores possuem até dois minutos para apresentar – e caso o representante não consiga executar a tarefa, a mesma volta para o sorteio. A competição possuí vencedores, que são descobertos na final da atividade, próximo ao fim do ano letivo. Entretanto, todos os alunos ganham uma medalha, já que o propósito da brincadeira é a integração, a busca pelo novo e o entendimento do outro.
Carmen contou que não só a inclusão entre colegas e turmas é importante, mas salientou a aprendizagem de uma nova língua, como essencial e integrante.
– Esse projeto movimenta todo o grupo de professores e alunos das mais variadas idades. Essa interação é o mais importante. Na língua de sinais, as regras gramaticais são espaciais, diferente do português formal. Para eles, a língua é visual, o que dificulta a apreensão do significado da língua portuguesa escrita – afirma Carmen, observando que o projeto pode facilitar a inclusão também em outras escolas. – É simples de realizar, não dá despesas em excesso e valoriza o cotidiano do aluno, e motiva pela superação – conclui.
A professora ainda enfatiza a importância que teve o sentimento de humildade na sua forma de ensinar. Carmen contou que trabalhar na educação de crianças e jovens, tendo em salas de aula alunos com deficiências auditivas, e alunos que não sofrem desta insuficiência física foi uma aprendizagem para ela mesma.
Geógrafa de formação, a docente reinventou o seu modo de dar aula, fazendo mais uso de ferramentas visuais e trabalhando diariamente com novos modelos de ensino. Carmen ainda lembra aos parceiros de profissão que não é fácil a tarefa, mas extremamente gratificante ver a evolução dos alunos, bem como dos colegas e de si mesma.
Sobre o preconceito e a dificuldade, ela falou: “Passamos por isso diariamente. Eu diria aos colegas, ‘não desistam’, busquem formas de trabalhar valores humanos. Exemplos de vida. Vídeos. Histórias. Tragam depoimentos para a sala de aula. Sejam modelo. Se reinventem e revejam conceitos que nós mesmo criamos.”
No ano de 2012, as escolas públicas de todo o país receberam autorização para ofertarem a categoria de ensino bilíngue a alunos com deficiência auditiva. E desde 2014, E.M.E.F Bilíngue Para Surdos Vitória, no bairro Mathias Velho em Canoas, disponibiliza este modelo de ensino.
Confira a entrevista completa com a professora Carmen neste link!
Veja o Mapa de Boas Práticas da FMSS aqui!